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17.11.15
E depois do massacre
Nós não somos iguais a eles. E eles não são os muçulmanos. Eles são todos os torturadores, todos os violadores, todos os soldados, todos os combatentes, todos os radicais, todos os jihadistas, todos os assassinos, todos que cometem crimes atrozes em nome de uma ideologia seja ela qual for. E a verdade é que os há em todo o lado. Pois que se lixe a ideologia que suporta comportamentos destes, seja ela de cariz, dito, ocidental, seja muçulmana, seja oriental. Seja o que for, onde for, em que circunstâncias for e pelo que for.
A mim o que me perturba é ver patetas dizerem absolutas barbaridades sobre a cultura muçulmana, tomando a nuvem por Juno, como se das duas uma: ou fossem quase todos criminosos desta estirpe ou a sua religião defendesse estes actos. Gostaria muito, talvez com alguma (muita?) ingenuidade, de pensar que o mundo muçulmano responsável, amante da paz e congregador conseguirá passar a mensagem certa por forma a evitar estigmas e ódios dispensáveis e geradores de guerras. Em guerra já nós estamos, mas quanto menos forem os inimigos melhor.
3.9.14
Deamblogações matinais
O auto-denominado Estado Islâmico está a conseguir o que queria desde o início: espalhar pelos quatro cantos do mundo a sua fama de impiedoso e brutal para com os inimigos, ou seja, todos os povos que não perfilhem a sua religião, numa interpretação extremista da sharia. Em suma, somos todos alvos potenciais do EI porque somos infiéis ou apóstatas.
Já disse aqui que o que vi feito pela gente que integra este movimento é muito para lá do que alguma vez imaginei nos meus piores sonhos: mulheres a serem violadas, crianças a serem decapitadas, homens e mulheres a serem degolados e crucificados, raids nas estradas matando tudo o que mexe, entre várias outras atrocidades, é um vale-tudo difícil de explicar, extremamente doloroso de ver e insuportável de aceitar.
Tenho acompanhado razoavelmente bem o debate sobre o EI e torna-se evidente que a comunidade internacional não sabe, e vai demorar a saber, como lidar com a questão: trata-se, na verdade, de um estado sem estado, que une pessoas, não em volta de uma identidade ou origem comuns, mas sim em torno de uma interpretação fanática da religião muçulmana. Para além disso, o saco é suficientemente fundo para albergar todo o tipo de pessoas que, estando-se a marimbar para a religião - ainda que o não assumam - querem andar aos tiros, a pilhar e a violar numa versão pós-moderna do Oeste americano (as personagens de Deadwood paracem uns verdadeiros anjos quando comparados com esta corja).
Existem, quanto a mim, duas questões essenciais que tornam o combate contra esta gente verdadeiramente difícil: a primeira tem que ver com o facto de o movimento se auto-financiar e contar com financiamentos avultados obscuros que ninguém parece capaz de identificar (estar numa zona rica em petróleo é, evidentemente, uma vantagem atroz); a segunda liga-se ao facto de as pessoas que estão no movimento e que são e serão recrutadas não terem qualquer receio da morte e, nessa medida, terem uma concepção da vida (e da sociedade) radicalmente diferente da nossa - aqui incluo tudo, desde o mundo ocidental, a África, passando pelo Extremo-Oriente. Penso que não será fácil encontrar por aí movimentos que, de forma massiva, façam crianças de 6, 7 ou 8 anos gritar a plenos pulmões que estão dispostos a lutar e morrer por um homem (no caso, Al Baghdadi) e saber bem a diferença entre ser mujahidin e mártir. Quando homens afirmam calmamente que só a guerra santa importa e que mais nada conta, nem família, nem amigos, nem a própria vida, está quase tudo dito.
Já se conhecia esta visão da vida há muito tempo e o EI não veio sobre isso trazer grande novidade, a não ser a extensão profusa dessa mesma realidade. Não se trata de meia dúzia de tipos entrincheirados nas montanhas do norte do Afeganistão que têm de se esconder dos rockets americanos. Bem pelo contrário. Estamos a falar de centenas de milhares de pessoas, que atingirão provavelmente os milhões num futuro próximo, e que controlam uma parte cada vez mais importante dos territórios sírio e iraquiano, para além de usarem e abusarem das novas tecnologias para se mostrarem ao mundo.
Tudo isto torna extraordinariamente difícil lidar com esta realidade e não serão certamente drones que destroem alguns tanques que irão resolver o problema. O irónico disto tudo é que Assad está a um curtíssimo passo de ser um aliado determinante dos EUA. A vida dá de facto muitas voltas.
Já disse aqui que o que vi feito pela gente que integra este movimento é muito para lá do que alguma vez imaginei nos meus piores sonhos: mulheres a serem violadas, crianças a serem decapitadas, homens e mulheres a serem degolados e crucificados, raids nas estradas matando tudo o que mexe, entre várias outras atrocidades, é um vale-tudo difícil de explicar, extremamente doloroso de ver e insuportável de aceitar.
Tenho acompanhado razoavelmente bem o debate sobre o EI e torna-se evidente que a comunidade internacional não sabe, e vai demorar a saber, como lidar com a questão: trata-se, na verdade, de um estado sem estado, que une pessoas, não em volta de uma identidade ou origem comuns, mas sim em torno de uma interpretação fanática da religião muçulmana. Para além disso, o saco é suficientemente fundo para albergar todo o tipo de pessoas que, estando-se a marimbar para a religião - ainda que o não assumam - querem andar aos tiros, a pilhar e a violar numa versão pós-moderna do Oeste americano (as personagens de Deadwood paracem uns verdadeiros anjos quando comparados com esta corja).
Existem, quanto a mim, duas questões essenciais que tornam o combate contra esta gente verdadeiramente difícil: a primeira tem que ver com o facto de o movimento se auto-financiar e contar com financiamentos avultados obscuros que ninguém parece capaz de identificar (estar numa zona rica em petróleo é, evidentemente, uma vantagem atroz); a segunda liga-se ao facto de as pessoas que estão no movimento e que são e serão recrutadas não terem qualquer receio da morte e, nessa medida, terem uma concepção da vida (e da sociedade) radicalmente diferente da nossa - aqui incluo tudo, desde o mundo ocidental, a África, passando pelo Extremo-Oriente. Penso que não será fácil encontrar por aí movimentos que, de forma massiva, façam crianças de 6, 7 ou 8 anos gritar a plenos pulmões que estão dispostos a lutar e morrer por um homem (no caso, Al Baghdadi) e saber bem a diferença entre ser mujahidin e mártir. Quando homens afirmam calmamente que só a guerra santa importa e que mais nada conta, nem família, nem amigos, nem a própria vida, está quase tudo dito.
Já se conhecia esta visão da vida há muito tempo e o EI não veio sobre isso trazer grande novidade, a não ser a extensão profusa dessa mesma realidade. Não se trata de meia dúzia de tipos entrincheirados nas montanhas do norte do Afeganistão que têm de se esconder dos rockets americanos. Bem pelo contrário. Estamos a falar de centenas de milhares de pessoas, que atingirão provavelmente os milhões num futuro próximo, e que controlam uma parte cada vez mais importante dos territórios sírio e iraquiano, para além de usarem e abusarem das novas tecnologias para se mostrarem ao mundo.
Tudo isto torna extraordinariamente difícil lidar com esta realidade e não serão certamente drones que destroem alguns tanques que irão resolver o problema. O irónico disto tudo é que Assad está a um curtíssimo passo de ser um aliado determinante dos EUA. A vida dá de facto muitas voltas.
9.8.12
Rumo ao Sul - Apontamentos 9
O papel das mulheres nas sociedades islâmicas é objecto das mais diversas leituras e opiniões por parte dos ocidentais. Não tenho competência nem conhecimento suficientes para falar sobre o tema. Ainda assim, há aspectos que me interessam. Em primeiro lugar, há que distinguir os países muçulmanos de que se fala. Marrocos não tem nada a ver com a Arábia Saudita, que por sua vez nada tem que ver com a Turquia ou a Tunísia e por aí fora. Dentro do próprio Islão, existem diferenças muito assinaláveis na forma como as mulheres vivem e se relacionam em sociedade. Ou seja, dentro do próprio Islão existem diversas interpretações e consequentes aplicações da Sharia, que é o código de leis islâmico. Desde o uso do Shador ao desempenho profissional, as mulheres têm uma missão que creio ser muito difícil no mundo árabe. Um dos aspectos que me fascinam em Marrocos é a convivência aparentemente pacífica entre diferentes vivências da Sharia: mulheres muçulmanas de tailleur cruzam-se com outras completamente tapadas, o que inclui as mãos e os pés (só os olhos aparecem por detrás de uma fresta pequena). É certo que não se vêem mini-saias nem mulheres com roupa de Verão e que, na sua grande maioria, há sempre uma ligação visível ao Islão - seja porque têm uma túnica, seja porque têm um lenço, seja porque não cruzam o seu olhar com homens -, mas nota-se uma abertura, ainda que ligeira, a costumes menos rigorosos. Mas ao mesmo tempo que vemos muitas mulheres nas ruas, não vemos todas as que estão em casa e de lá pouco ou nada saem, porque o seu papel na economia familiar é o tratamento do lar.
Ao falar com um marroquino upper class e tendo-o questionado sobre uma aparente subalternização da mulher relativamente ao homem, o mesmo respondeu-me que assim não era e que a Sharia colocava ambos os sexos em igualdade de circunstâncias, embora defendendo papéis distintos na sociedade. Frisou que ambos têm direitos e obrigações que se entrecruzam e que devem ser praticados, dando como exemplo que uma mulher não deve olhar nos olhos outro homem porque pode estar a dar um sinal errado (tem, pois, como obrigação não olhar), mas o homem também não deve procurar que a mulher se sinta tentada a olhar para ele (tem, também, assim a obrigação de não olhar). Não desenvolvemos o tema, mas tenho dúvidas sobre as consequências desta regra ser quebrada, sobretudo sobre quem seria culpado. Quer-me parecer que não seria o homem...
Por outro lado, falei sobre o mesmo tema com uma estrangeira casada com um marroquino que me assegurou que a sociedade islâmica trata diferentemente ambos os sexos, diminuindo o papel e importância da mulher relativamente ao homem. Admito que é visível essa diferenciação (na rua vêem-se muito mais homens, nos cafés só se vêem homens e não podem entrar mulheres, etc., etc.), mas não estou seguro acerca da generalização. Até porque - e sobretudo porque - percebi que a Sharia permite diversas interpretações.
A propósito disso, vi uma entrevista de Nuno Rogeiro a um professor de Direito Islâmico na Sociedade das Nações (que não me parece ainda estar disponível on-line) que permite concluir isso mesmo.
Para aprofundar.
Ao falar com um marroquino upper class e tendo-o questionado sobre uma aparente subalternização da mulher relativamente ao homem, o mesmo respondeu-me que assim não era e que a Sharia colocava ambos os sexos em igualdade de circunstâncias, embora defendendo papéis distintos na sociedade. Frisou que ambos têm direitos e obrigações que se entrecruzam e que devem ser praticados, dando como exemplo que uma mulher não deve olhar nos olhos outro homem porque pode estar a dar um sinal errado (tem, pois, como obrigação não olhar), mas o homem também não deve procurar que a mulher se sinta tentada a olhar para ele (tem, também, assim a obrigação de não olhar). Não desenvolvemos o tema, mas tenho dúvidas sobre as consequências desta regra ser quebrada, sobretudo sobre quem seria culpado. Quer-me parecer que não seria o homem...
Por outro lado, falei sobre o mesmo tema com uma estrangeira casada com um marroquino que me assegurou que a sociedade islâmica trata diferentemente ambos os sexos, diminuindo o papel e importância da mulher relativamente ao homem. Admito que é visível essa diferenciação (na rua vêem-se muito mais homens, nos cafés só se vêem homens e não podem entrar mulheres, etc., etc.), mas não estou seguro acerca da generalização. Até porque - e sobretudo porque - percebi que a Sharia permite diversas interpretações.
A propósito disso, vi uma entrevista de Nuno Rogeiro a um professor de Direito Islâmico na Sociedade das Nações (que não me parece ainda estar disponível on-line) que permite concluir isso mesmo.
Para aprofundar.
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