20.7.15

Deamblogações nocturnas

É quando te revejo passar diante dos meus olhos, os da memória, que bebo de um trago toda a saudade. Nela me enebrio com a passagem do tempo, como se o ontem tivesse sido só até já.
Vejo-te e toco-te de cabeça aberta e coração ferido pelas marcas que se foram afundando, nas lágrimas que tantas vezes caíram sempre que me levantei de mais um sono prolongado no qual voltei a tocar-te e a sentir a tua existência.
Essa densidade material que deixaste de ter, que eu deixei de poder sentir, que os teus e os nossos deixaram de poder partilhar.
Parece um silício que aperta, agrilhoa, magoando sem magoar, fazendo sangrar sem que escorra sangue, apertando sem se dar por isso; algo que está para nunca mais ir embora, que se alojou como um vírus implacável que me faz lembrar e sentir a fraqueza dos fortes contra os fracos e débeis espíritos.
Nesse suor constante e peganhento que escorre e escorre sem parar, exalo o que tive, tento lamber cada gota, numa tentativa porventura vã de resgatar uma ideia de mim próprio, quiçá sem qualquer significado a não ser aquele que eu lhe atribuo.
Confesso-te que são vezes sem conta aquelas em que perco o mapa da vida e me exorto ao recomeço repetido na esperança de chegar a algum lado.
Fui sempre assim nesse retomar teimoso e persistente; é ele que me faz saber que a saudade que trago comigo me impele à vida em vez de a derrubar de vez.
Tenho saudades tuas.