3.12.22

A um tempo ausente

Houve dois concertos, nós fomos ao primeiro, na quinta-feira passada, na Culturgeste (de quem foi a magnífica ideia de fazer um concerto que tinha tudo para ser uma festa num sítio onde se está sentado em sofás?). Acabei de ler no Expresso que aquilo foi mais uma reunião de amigos do que outra coisa, mas isso é dizer pouco. Foi um concerto muito longe de perfeito - foram vários os pregos a meio das canções e o som estava sofrível - mas nada disso importou para alguma coisa. Foi, de facto, uma reunião de amigos, quer os que estavam no palco, quer os que estavam a assistir. Mesmo que não se conhecessem. Foi o desfiar - embora um desfiar reduzido porque uma hora e vinte é demasiado pouco para desfiar convenientemente uma história - de um quase nada de vários anos que marcaram profundamente a história da música portuguesa. Do lado do palco sentiu-se uma evidente comoção, desde logo do Pedro Oliveira, mas também, à sua maneira, do Francisco Meneses, do Gabriel Gomes e do Rodrigo Leão, este sempre mais seráfico e compenetrado. Do lado de cá, das cadeiras, era evidente o entusiasmo e a simultânea frustração, o primeiro porque se estava a assistir à reunião de uma banda que deixou de tocar há muito, a segunda porque foi evidente o desacerto daquela sala para o evento em questão.

Musicalmente não foi uma perfeição, longe disso, mas na verdade ninguém ali foi para "ouvir" música. Todos ali foram para "sentir" e "viver" música. Detestei alguns acordes, assim como não gostei que tivessem cortado uma ou outra canção, mas tudo isso foi indiferente.

O que vi e senti foi uma viagem não apenas pela música, mas também pela vida. Pela vida deles e pela vida de todos nós que ali estávamos, individual e colectivamente considerada. Não nos conhecíamos, mas era como se nos conhecêssemos de sempre. Ali, naquele tempo e espaço musical, partilhámos uma vida em pouco mais de uma hora e isso é único.